domingo, setembro 23, 2007

A busca

Preciso de uma empregada para me ajudar, e há três meses que procuro. Não pode dormir em casa, porque aqui não tem espaço. Não pode morar longe, porque além do alto custo das passagens, como trabalho à noite, ela vai precisar ficar com Antonio até tarde, vários dias por semana, e a maioria dos ônibus de Recife só circula até 22h. Não precisa ser nenhum ás na cozinha nem craque na arrumação, mas tem que gostar muito de criança e estar disposta a respeitar e cumprir minhas decisões a respeito do meu filho.

Semana passada, veio uma candidata.

Janaína, dezenove anos (ui). Já tomou conta de vários sobrinhos e dos meninos da vizinhança, mas nunca trabalhou em lugar nenhum. Não tem carteira, nunca tirou, e não se incomoda se eu assinar ou não (tou fora). Fala como uma matraca, a 78 rpm. As unhas vermelhas têm uns dez centímetros de comprimento. Compareceu à "entrevista" de short curto e blusa decotadíssima, com o material quase todo de fora (Antonio provavelmente iria apreciar, mas Leo não gostou). Esperou Leo se retirar (impaciente com tanta falação) para me explicar que ainda não teve filhos porque toma pílula desde os 13 anos e por isso as tetas assim, salientes (?). Pode trabalhar todos os dias, de manhã, de tarde e à noite, sem folga se for o caso (ahã). Gosta muito de crianças, mas elas têm que ser bem treinadas desde pequenas e assim EU TENHO que comprar desde já um quadrado (cercadinho) para acostumar Antonio a ficar sozinho e quieto, sempre. Nada de pegar criança no braço, bebê tem que ser criado sem frescura, o primo dela come feijão desde os três meses.
Depois que saiu, disse à colega que tinha dado a dica do emprego que EU TENHO que comprar um quadrado (fiquei só pensando que, no mínimo, Antonio iria chorar quatro horas diárias seguidas, quando ela estivesse sozinha e completamente responsável por ele) e que está procurando vaga como vendedora no shopping aqui perto, e que assim que a vaga saísse, iria me dar um pé na bunda.

Cheguei a combinar que começaria amanhã, mas depois juntamos nossas impressões e o resumo não deu em boa coisa.

Leo não a quis.

Eu não a quero.

Estamos tão felizes de continuarmos sozinhos...

segunda-feira, setembro 17, 2007




Baixou a revolta em mim, nestes últimos dias: depois de meses sendo enrolada, sofrendo, e faltando apenas quatro semanas pra o nenê nascer, larguei a terceira médica consecutiva do meu plano de saúde fuleiro. Motivo: há semanas ela vinha me torturando, tentando encontrar uma doença que justificasse a cesariana eletiva / prévia que queria realizar em mim.


Só Deus sabe como não fiquei me sentindo uma doente terminal, ao longo desse processo. O "diagnóstico" é que estou com diabetes gestacional (embora como filha de diabética eu saiba interpretar um exame e meu índice de glicose tenha ficado sempre em torno dos 75, quando o normal é de 60 a 130) e também hipertensa (tirando um pico de pressão 15x9 plenamente justificável, nunca vou além dos 12x8). Ainda assim, para me "acompanhar" a contento, ela passou umas dez ultrassonografias (que mostram o filhote saudabilíssimo e encaixadinho à esquerda, pronto pra nascer sem problemas, mas que precisam ser autorizadas uma a uma na central do plano de saúde, e isso é um saco), solicitou parecer especializado (me obrigando a ser acompanhada por um cardiologista que me recebeu, disse que estou ótima e não recomendou nenhuma outra atitude/atividade, muito menos remédio) e passou "apenas" cinco perfis glicêmicos (ou seja, por cinco vezes fui furada em jejum, depois do café, depois do almoço e após o jantar, sem nenhuma necessidade).


Na última consulta, usou esses "dados científicos" pra justificar a necessidade de marcar uma cesárea de urgência (!), já esta semana, sem se importar sequer se Antonio ia nascer ou não prematuro. Claro que não podia ser no fim de semana, afinal médico também é ser humano e só deve trabalhar nos horários convenientes a ele. Claro que não podia ser no hospital melhor, que fica longe de minha casa - a cirurgia tinha de ser no mais próximo e mal-falado, com alto índice de infecção hospitalar, porque assim era melhor pra ela... Claro, claro. Perfeitamente compreensível. Eu só preferia que ela fosse sincera e confessasse, de repente, que meu plano paga mal e ela não queria perder tempo me atendendo de madrugada, por exemplo. Que ganha na quantidade de mulheres que atende diariamente. Que em Recife, 95% dos partos realizados em hospitais privados são cesarianas. Que o Ministério Público está realizando esta semana uma audiência pública para investigar o fato escandaloso de que no Brasil, fora do SUS, mais de 80% dos partos realizados são cesáreas, contra o máximo de 10% preconizado como realmente necessário pela Organização Mundial de Saúde.


Fiquei com tanta raiva que acabei recorrendo à médica particular que me tinha sido recomendada desde sempre, e que o liseu e a vontade de usar os recursos do plano de saúde não me permitiam utilizar. Ela deu desconto na consulta, combinou de parcelar os honorários em zentas vezes, e agora meu filhote pode nascer no dia em que quiser, e se Deus quiser, de parto normal.


Ainda estou meio abismada com a reação das pessoas a meu "radicalismo" (a maior parte das futuras mamães prefere fazer cesárea direto, sem qualquer indicação, e acha que essa preocupação é frescura minha). mas eu não tenho a menor vontade de fazer uma cirurgia de grande porte sem necessidade, e é isso que esta cesárea ia ser - ainda mais se fosse pra meu filho nascer já, cheio de possíveis mazelas por ser tirado da barriga fora do tempo.


A equipe médica que está me atendendo agora é tudo de bom: Leila Katz e Melania Amorim, e mais uma doula, Dan Gayoso. Sonho de consumo total. Já escrevi meu plano de parto e estou tranquila e feliz. Não me perguntem quando meu filhote nasce, porque agora quem decide é ele. Tem até 20/10 pra se desenvolver bastante e resolver qual é a boa hora.